"Ah, se eu aguento ouvir
Outro não,
quem sabe um talvez
Ou um sim,
Eu mereço enfim... "
É, Paquetá.
Seja pela letra do Amarante ou pelo cenário descrito nos textos de Joaquim Manuel de Macedo, autor de A Moreninha (o primeiro romance do Romantismo Brasileiro!), eu só sei que tenho uma relação muito peculiar com esta ilha. E isso veio depois de velho!
Atualmente, sempre que possível, arrumo uma desculpa para visitar esta ilha; com o advento da fotografia em minha vida, confesso que ficou mais fácil. No entanto, o que passou a ser difícil foi conseguir companhia(s) para visitá-la. Enfim, nem tudo é perfeito.
Se o meu hipocampo não falhar, o primeiro (re)contato que tive com Paquetá ocorreu em 2007, na época que eu ainda estudava cavaquinho/choro, na Escola Portátil. Foi neste ano que nasceu um projeto chamado O que é que a Baía tem? / Chorinho na Barca, onde a proposta era um grupo tocando choro na barca de ida das 10:30, parando para o almoço quando chegava em Paquetá e depois continuando num centro cultural que lá existe, a Casa de Artes Paquetá. Eu fui no primeiro Choro na Barca que teve, que ocorreu em Agosto de 2007 e teve a grande Luciana Rabello como primeira participante deste projeto.
Foi lindo...
Vale dizer que o projeto acontece até os dias de hoje, apesar de ter sofrido algumas interrupções ao longo destes anos.
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Enquanto eu observava aquele momento mágico e histórico, que foi o primeiro Choro na Barca correr bem em frente aos meus olhos, tudo que eu queria ter era uma câmera nas mãos. Reflexos de fotógrafo ainda no meu subconsciente. Dois, três anos depois, a cena se repetiu e eu estava preparado, com a D60 ao meu lado; melhor, no meu ombro. E o resultado inicial foi esse daqui; confiram:
Fiquei muito feliz quando fiz esta última foto.
A composição ficou bem do jeito que eu queria, com a congruência das linhas ocorrendo no canto inferior esquerdo e uma sensação de paz - a mesma quando sentamos em frente ao mar e ficamos pensando na vida, ou não pensando em nada.
Ou seja, estávamos indo para Paquetá! Realmente não tínhamos que pensar em nada. Era apenas sentar e curtir o visual, a música, o momento - no melhor estilo carioca de se viver.
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Conforme comentei ali em cima, sempre que penso ir a Paquetá eu gosto de convidar pessoas queridas em minha vida, pois é algo muito importante para mim. É como se eu compartilhasse algo, da minha história, não sei.
Essa minha ligação com Paquetá está intimamente relacionado com o samba.
Mais ou menos há 6 anos atrás, quando vivia na Lapa e em contato mais próximo com a cultura brasileira e, acima de tudo, carioca, fui assistir um show no Circo Voador muito interessante. Era o grupo Dobrando a Esquina, que tinha como líder a cantora Luciane Menezes. Ela sempre buscou resgatar a cultura negra e popular, trazendo uma influência direta destes ritmos para a música do grupo. Então, o show que ela apresentara, na época, tinha muito choro, jongo, maracatu, ciranda, coco, samba de roda, e todas estas culturas populares e típicas de cada região deste Brasil.
Pra mim, aquilo era um prato cheio, pois tudo que eu buscava ouvir naquele momento da minha vida estava ali. Lembro-me bem do show porque foi a primeira vez que dancei ciranda; muito bom! Era uma terça-feira a noite e eu era a alegria em pessoa, voltando pra casa todo bobo. =)
Uma das músicas que ela apresentara, e que depois tive o prazer de ouvir no CD do grupo, que (obviamente) eu comprei, foi uma composição do Luis Claudio Ramos e Franklin da Flauta, com letra do Aldir Blanc, chamada Santo Amaro.
Eu ia a pé lá da ladeira Santo Amaro
até a rua do Catete num sobrado onde você residia
e te levava prum passeio em Paquetá
onde nasceu num pic-nic o nosso rancho
o Ameno Resedá
Verde, grená e amarelo nossas cores
Resedá, vocês são flores como flor era a Papoula do Japão
Tua rival saiu na Flor de Abacate
de destaque no enredo da Rainha de Sabá
Os lampiões, os vagalumes, você triste com ciúmes
eu charlando, resmungando que melhor era acabar
Pobre farsante de teatro ambulante
meu amor de estudante não soube representar
E o casamento aconteceu,
vieram filhos, muitos netos
muitas dores, muitos tetos
mas o amor a tudo isso ultrapassou
Hoje, sozinho, eu voltei feito andorinha
à Pedra da Moreninha onde tudo comecou
Olhando o mar, pensei na vida ao teu lado
como um choro do Callado, um piano em Nazareth
Saudade grande o dia inteiro, mas com jeito de alegria
do pandeiro do Gilberto no Jacob
Pra cada dó, um sol maior, um lá sereno,
a harmonia do ameno, o amor do resedá
Eu funcionário aposentado, coração não conformado
antigo e novo feito lua em Paquetá
Passou a vida com os ranchos, desfilando
União da Aliança, caprichosa em estrelas ilusões
desci por ela como desço ainda hoje
a ladeira Santo Amaro até o sobrado que o metrô matou
Bom era ir, batendo perna, tomar chope na Taberna
é outra história, é uma glória, ser da Glória
o que é que há ?
O rosto dela vela o Rio de Janeiro
como a virgem do Outeiro
guarda o Ameno Resedá
Lindo.
Ouvi esta música no show e ela ficou gravada na cabeça, principalmente por causa da parte que diz "Pra cada dó, um sol maior, um lá sereno, a harmonia do ameno, o amor do resedá"; essa brincadeira com as notas foi o que marcou a música naquele momento. Fiquei louco para descobrir a história desta música, de quem era, etc.
A letra que o Aldir Blanc colocou neste choro (sim, Santo Amaro inicialmente era um choro do Franklin com o Luis Claudio) é algo indescrítivel, um caso a parte. A estória que ele relata, do casal que teve a história de suas vidas envoltas por choro, samba, ranchos (ah! os ranchos...), carnaval, filhos, Paquetá; ele consegui materializar o amor e a felicidade do casal dentro desta letra. Achei fantástico isso!
Pode ser um amor ideológico, um amor bucólico, mas não interessa: ainda sim, é assim que eu vejo esta música.
É impossível, para mim, ouvir Santo Amaro e não visualizar a história ali contida. Inclusive, eu acho que um casamento, um relacionamento, deveria ser como essa música. Eu tomo isso como um exemplo para mim, como algo a construir - embora
não faça a menor idéia do porque estou dizendo tudo isso. Na verdade, só estou dizendo porque não divulgo este blog e sei que ninguém vai lê-lo (eu espero! =). No fundo, ainda acho que só escrevo aqui porque estou seguindo os conselhos de uma amiga, e deixando registrado as minhas memórias, de um fotógrafo desconhecido, nem que seja para apenas eu mesmo ler.
Só para deixar registrado, o Rancho Flor do Sereno, um dos melhores "blocos" de carnaval da atualidade no Rio de Janeiro (digo "bloco" porque ele não é um bloco, e sim um rancho), também gravou a música Santo Amaro no CD deles. Uma gravação linda e impecável, na voz do Pedro Paulo Malta. Vale a pena conferir.
Enfim, uma letra que me remete a tudo isso: Rio de Janeiro antigo, Glória, Catete, samba, rancho, carnavais, Paquetá, amor, felicidade, simplicidade na vida... para mim, um exemplo a ser seguido. Acho que fiquei meio bucólico.
As fotos que colocarei abaixo é o resultado de como eu tento viver a vida: de maneira simples e feliz. E Paquetá acabou se tornando um sinônimo disso.
Por isso esta ilha é tão especial para mim.
Sem mais ressalvas, eu lhes mostro a minha visão de Paquetá:
Abaixo são as fotos do choro, acontecendo na Casa de Artes Paquetá.
A melhor parte de ter ido a Paquetá neste dia foi a presença do grupo Samba da Ouvidor - famoso por manter uma roda de samba de rua, na esquina da rua do Mercado com a Rua do Ouvidor, quinzenalmente aos sábados, a partir das 15 horas. Neste dia das fotos, eles deram uma esticada e foram relaxar em Paquetá - e a melhor forma de fazer isso é com muito samba e cerveja!
Pra mim foi ótimo: após curtir o choro, corri pro samba para fazer umas fotos lá também. Seguem elas:
Bom, é na lembrança do som de um prato e faca que eu vou indo embora.
Num próximo post prometo escrever pouco!
Inté.
Fotógrafo Desconhecido